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04/05/2020

Maria: Mãe, Mestra e Rainha dos Apóstolos (parte 1)

Por Pe. Antonio Lúcio, ssp

Introdução

  Afirmava o Bem-aventurado Tiago Alberione: “Maio a Maria! É possível mudar de continente, achar-se em terra, no mar, no ar; encontrar novas raças, outras civilizações, línguas diferentes, mas sempre a mesma Mãe, sempre corações de filhos, sempre a mesma devoção. Como é consolador!”

Minha proposta nesta reflexão e oração é simplesmente apresentar-lhes, como recordação, alguns pontos de nossa Espiritualidade Mariana da Família Paulina, que é fundamentalmente apostólica. Maria é nossa Mãe e Mestra na missão paulina: evangelizar na cultura da comunicação! É dela que aprendemos a fazer apostolado.

  1. Maria na vida do Pe. Alberione: os Santuários!

Maria foi uma presença viva e significativa durante toda a existência do Pe. Alberione, começando desde a sua infância. Assim ele escrevia em 1956: “A mãe nos tinha consagrado todos a Maria, Rainha das Flores, logo que nascemos”. Ele gostava de recordar que tinha aprendido a amar profundamente a Maria, ainda no colo de sua mãe, D. Teresa. Afirmava: “Era fácil rezar a Maria quando éramos pequenos. Nossa mãe pegava nossas mãozinhas, colocava-as juntas e dizia: ‘Ave, Maria’; e nós, talvez um pouco distraídos, para dar alegria à mamãe, pronunciávamos as palavras. Quantas vezes, a mamãe nos terá levado à Igreja, diante de Nossa Senhora, e nos terá consagrado a ela! Portanto, desde pequenos, com quatro ou cinco anos, já rezávamos a Maria” (Pr RA 117).

A devoção mariana de Pe. Albrione está ligada a três santuários:

  1. Santuário de Nossa Senhora das Flores, em Bra, onde foi consagrado pela sua mãe a Maria e onde assumiu os primeiros compromissos com Maria (cf. MV 114).

  2. Santuário de Nossa Senhora da Moretta, em Alba: local da sua oração, quando clérigo e nos primeiros anos de sacerdócio (cf. HM VI, 47). Neste Santuário, especialmente, aconteceu a escolha definitiva de sua vida: o encaminhamento para sua missão específica na Igreja. Era o dia 12 de setembro de 1911 (cf. CISP 179).

  3. Santuário “Rainha dos Apóstolos”, obra monumental, fruto de uma promessa feita no início da Segunda Guerra Mundial: “Ó Maria, Mãe e Rainha dos Apóstolos, se salvardes a vida dos nossos e das nossas, construiremos aqui a igreja em louvor ao vosso nome”. Ele mesmo recordou esse fato a 8 de dezembro de 1954, dia conclusivo da dedicação do Santuário (cf. CISP 595s).

Em sua obra de Fundador, afirmou, em diversas oportunidades, a presença insubstituível de Maria: “Maria é a Mãe dos Religiosos. Ela está na origem das instituições religiosas, como esteve no princípio da Igreja, antes de Pentecostes” (SVP 212). “Somente com Maria, um Fundador pode conceber e iniciar uma instituição; é necessária uma soma tão grande de graças, que somente nela se pode esperar que seja fácil aquilo que por si mesmo é árduo e impossível” (RdA 276s).

Pe. Alberione escreveu muitíssimo a respeito de Maria, mesmo que permaneça difícil elaborar um ensinamento lógico e progressivo. Em seus escritos existe um complexo de 1700 páginas de celebração mariana; deve-se, porém, partir sempre de sua vida e de sua missão, para compreender o seu pensamento mariano.

Pe. Alberione foi, sobretudo, um homem de intensa oração mariana. Sendo tantas as páginas de seus escritos, é incalculável o número de rosários recitados, especialmente depois de 1914, quando, já iniciada a primeira construção, foi atingido por estranha e aguda forma de artrose que não lhe permitiu, até a morte, dormir mais do que poucas horas por noite. E continuou sempre assim, até os dias 25-26 de novembro de 1971, quando no fim da vida, com o seu já gasto rosário nas mãos, movia os lábios em ritmo incessante, expressão daquela oração contínua que se havia tornado a sua respiração e o seu sustento.

       Acredito que em nossa história pessoal as coisas não foram tão diferentes das da dele. Também através de nossas mães, oxalá de nossos pais, aprendemos desde crianças a venerar a Maria como mãe de Jesus e nossa.

  1. Alberione e a devoção a Maria

   

       É o próprio Pe. Alberione que explica o significado da devoção a Maria: “Devoção significa ‘consagração’, entrega, doação total e integral de nós mesmos, com as forças físicas, morais, intelectuais e também no ser do que provêm essas forças; tomar e dar toda a pessoa em sua luz, em seu espírito, em seus exemplos e em sua graça” (Pr DM 36).

Partindo desta explicação, orienta toda a sua mariologia à missão: “Nos damos a Maria como chamados ao apostolado, nos inspiramos nela como enviados. A devoção a Maria, que é uma parte do espírito paulino, tem para nós duas finalidades: nossa santificação religiosa e o apostolado pastoral, chegar às almas” (Pr RA 231).

No dia 8 de dezembro de 1919, quando os Primeiros Paulinos perguntaram ao Pe. Alberione sobre o título mariano com que deveriam se dirigir a Maria, ele respondeu: “Já tinha pensado e rezado, e, então deu a resposta: invocar a Maria sob o título ‘Rainha dos Apóstolos’: para que sejam santificados os apóstolos e as apóstolas, para que as pessoas recebam o bem secundando aos apóstolos, e para que os apóstolos e fiéis se reúnam todos no céu” (Pr RA 234).

“A primeira devoção que encontramos na Igreja é a devoção à Rainha dos Apóstolos, como se expressa no Cenáculo”, gostava de repetir o Pe. Alberione. E notando que “esta devoção se desvaneceu e se obscureceu com o transcorrer dos séculos”, exortava: “A vós, o doce encargo de reunir os fiéis em torno de Maria Rainha dos Apóstolos; a vós, o encargo de despertar esta devoção; a vós, realizar esta doce tarefa na Igreja.” Ela “significa despertar novamente os apostolados, incentivar as vocações.” E concluía com convicção: “Voltemos às fontes. Aí, nas fontes, encontramos Maria Rainha dos Apóstolos” (HM VIII, 80).

  1. Funções marianas: Mãe, Mestra e Rainha!

      

Sendo ainda seminarista, o Pe. Alberione entrou em contato com a Encíclica Adiutricem Populi Christiani (Auxiliadora do Povo Cristão) do Papa Leão XIII (1895). Expressão aplicada a Nossa Senhora, já que esta Encíclica se refere ao santo rosário, e captou nela uma frase que foi para ele como um raio de luz carismática: “Com plena verdade – escrevia o Papa – Maria deve ser considerada Mãe da Igreja, Mestra e Rainha dos Apóstolos”. Assim, o Pe. Alberione encontrou nestes três títulos o resumo de todas as funções marianas: Mãe, Mestra e Rainha.

Fundador de uma Família Apostólica, a Família Paulina, o Bem-aventurado Tiago Alberione sentiu de modo especial a presença da Mãe de Deus em suas atividades apostólicas, e convidou suas Congregações a venerá-la com o titulo de “Rainha dos Apóstolos”. Em Roma dispôs as casas mais importantes da Família Paulina ao redor de um Santuário que ele mesmo construiu e dedicou à Rainha dos Apóstolos (1954), como homenagem filial à Protetora de toda sua obra. Fez muitas considerações sobre a Virgem-Mãe, enfocando-a sob o aspecto de Rainha dos Apóstolos: portadora de Cristo integral, e, portanto, exemplo máximo de “apostolado”.

O título “Rainha” não tem nada ver com “realeza”, no sentido que damos hoje. O sentido de “Rainha” corresponde ao de “Rei”, atribuído a Jesus. Jesus é Rei, porque veio instaurar o “Reino de Deus”, o reino de amor e de justiça que gera relações de fraternidade. Maria é Rainha porque se faz “serva de Deus” e contribui de maneira decisiva para o anúncio do Reino, ao trazer Jesus ao mundo. Com seu exemplo de plena disponibilidade à vontade de Deus, Maria se torna “Mestra” de todos os apóstolos. Por isso, na espiritualidade da Família Paulina, Maria é invocada não só como Rainha, mas também como Mãe e Mestra dos apóstolos.

O Fundador apresenta o magistério de Maria em três direções, que desenvolve amplamente no opúsculo que tem por título “Maria, Discípula e Mestra”, de 1959 (cf. CISP 1331-1351).

  1. A santidade do exemplo. Se quisermos nos conformar a Cristo e nos identificar com ele, o caminho mais fácil é Maria:

– Pela sua fé: “És bem-aventurada, Maria, porque acreditaste”.

– Pela sua esperança: “Fazei tudo o que ele vos mandar”.

– Pela sua caridade: “Faça-se em mim segundo a tua vontade”.

  1. A eficácia de suas orações.
  2. A autoridade de seu conselho, porque Maria foi plena de graça e de sabedoria.

“Se afirmamos ‘Por Maria a Jesus’, será igualmente digna a frase: ‘Por Maria Mestra a Jesus Mestre’” (cf. CISP 1331).

  1. Espiritualidade Mariana

A espiritualidade da Família Paulina é cristocêntrica e mariana. É de Maria que aprendemos a fazer apostolado. Ela é nossa Mãe e Mestra na missão. Nossa espiritualidade mariana é profundamente apostólica. Maria foi a primeira apóstola, discípula e comunicadora da Palavra feita carne humana: “Mais que com tinta, Maria, escreveu Jesus, isto é, formou-o com seu próprio ser, com seu sangue, por virtude do Espírito Santo. Dando-nos Jesus, deu-nos nele, o santo Evangelho” (Pe. Alberione).

Sabemos que a visão de Pe. Alberione sobre Maria, sua “vida de fé”, sua “autêntica espiritualidade mariana”, está toda ela centrada no título de “Rainha dos Apóstolos”: “Rainha dos Apóstolos quer dizer aquela que trouxe o Cristo físico ao mundo, e aquela que forma e nutre o Cristo místico: a Igreja. Ela é a verdadeira apóstola; com Jesus Cristo e dependente dele. Todos os demais apóstolos participam do apostolado de Jesus e de Maria” (Pe. Alberione).

  1. Maria é apóstola: deu Jesus ao mundo!

 “Ser-para-Cristo”: esta é a essência espiritual de Maria. Pe. Alberione, organizador de obras apostólicas para tempos novos, perscruta atentamente, na Palavra de Deus, o sentido de “apostolado” e descobre em Maria a realização original e perfeita do objetivo apostólico específico de cada pessoa chamada: “gerar” e “formar” Cristo nas pessoas.

Se o apostolado, em seu sentido integral, é gerar e fazer crescer o Cristo nas pessoas, Maria é a própria expressão do apostolado: ela gerou (= edidit) Cristo para o mundo. A partir dessa intuição, assume todo o seu valor o apostolado das edições, em sentido amplo: “Com o nome de ‘edição’ não entendemos apenas um livro; entendemos outras coisas. A palavra “edição” tem muitas conotações: edição do periódico, edição de quem prepara o script para o filme, de quem prepara o programa para a televisão, de quem prepara as mensagens a serem comunicadas por meio do rádio. ‘Edidit nobis Salvatorem’, diz a Liturgia. A Virgem nos deu o Salvador. Usa o verbo ‘edidit’” (Pr 1954, 137).

Antes de tudo, Maria “sempre traz Jesus, como um ramo traz o fruto, oferecendo-o às pessoas” (CISP 38). Ela “irradia” Jesus. O verbo “irradiar” indica a natureza do apostolado, que é sempre e acima de tudo “recepção”, “assimilação” e “testemunho” do Cristo anunciado e dado (RdA 17).

Descrevendo o apóstolo, Pe. Alberione delineia estas características:

Maria nos dá Jesus Mestre, Caminho, Verdade e Vida. E no-lo dá todo inteiro. A sua ação não se esgota no “dar Jesus”, mas pretende formá-lo nas pessoas. Eis por que Maria “forma e alimenta o Corpo místico”, tornando-se, assim, o modelo de todo apostolado: “Maria nos deu Jesus: nele, todos os bens e o bem todo. Os santos e os corações apostólicos têm o apostolado dividido; Maria o possui todo inteiro. Ela é a apóstola universal no espaço, nos tempos, nos indivíduos. Os apostolados e os apóstolos agem em tempos e lugares próprios; Maria age sempre; age em todo lugar; e tudo chega até nós por meio de Maria. Esta é a sua vocação, a sua missão: dar Jesus Cristo” (RdA 20).

A vida grita sempre mais forte do que as palavras que pronunciamos e do que as obras que fazemos. Portanto, o apóstolo primeiro é, e depois faz (cf. Mt 4,18-22; Mc 1,17; Lc 24,48; Jo 15,27; Jo 20,21-23; At 4,33; 1Cor 3,5-15; 2Cor 12,12; Ef 6,19s.; Cl 1,25-29; 2Tm 1,11; 2,15).

 5.1.  A imagem da Rainha dos Apóstolos

A visão Mariana que Pe. Alberione nos quis deixar com o quadro ou a imagem da Rainha dos Apóstolos é a Mãe que oferece ao mundo o Filho, Caminho, Verdade e Vida. Esta é também a missão de cada membro da Família Paulina enquanto viver. O inesquecível Pe. Renato Marcello Perino, ex-Superior Geral dos Paulinos, falecido em 21 de setembro de 1995, recordava em 1987 a insistência do Pe. Alberione ao escultor escolhido para traduzir plasticamente a Rainha dos Apóstolos: “O menino não deve ficar agarrado a Maria, como se esta o retivesse num gesto de ternura possessiva, mas literalmente oferecido, dado ao mundo, com seus bracinhos abertos em cruz e levando nas mãos o rolo da Palavra, porém separado fisicamente do corpo da Mãe”. Fazendo referência a este quadro, o Pe. Alberione, com admirável bom humor, dizia em 1951: “Não sabemos ainda muito sobre Maria, Rainha dos Apóstolos. Uma vez ouvi esta afirmação, tão estranha: na imagem da Rainha dos Apóstolos não há nada que se refira ao apostolado. Como assim? Não há Maria que nos oferece o Cristo? E o que é o apostolado, senão dar o Cristo?”.

Maria, a mãe de Jesus, sob o título “Rainha dos Apóstolos”, ocupa lugar especial na espiritualidade paulina. A imagem de Maria, ideada por Pe. Tiago Alberione, espelha o seu significado. Ela está segurando Jesus, porém, não o retém para si, mas o oferece ao mundo. O nosso Bem-aventurado Fundador quis mostrar com esse gesto que a missão do apóstolo é a mesma de Maria, ou seja, consiste em ter Jesus consigo e em oferecê-lo ao mundo através do seu apostolado.

5.2. Missão da Família Paulina = Missão de Maria

Creio não ser necessário insistir que a missão da Família Paulina é a mesma de Maria: dar Jesus, Divino Mestre e Pastor, Caminho, Verdade e Vida ao mundo! A Família Paulina “tem, no plano humano, a missão que teve Maria no plano divino”. Talvez nos falte ter sempre presente que “todo apostolado é uma irradiação de Jesus Cristo, dar algo de Jesus Cristo”. Para que realmente nossa missão seja apostolado, este deve estar impregnado de Deus. Porém, antes, nós é que devemos estar impregnados de Deus: “Ninguém pode exortar os outros, se não der o exemplo. Por isso cada um pedirá a graça de uma verdadeira santificação da própria vida” (Pe. Alberione).

Não somos nós os que chamamos a Maria para que nos venha socorrer em nossos trabalhos apostólicos, senão que é ela quem nos convida a participar de sua missão maternal e prolongar sua obra. O que espera primeiramente de nós não é o tributo de nossa admiração, mas o de nossa colaboração. Maria quer que traduzamos nosso amor a ela, realizando um apostolado fecundo como foi o dela. O caráter mariano do apostolado paulino não é facultativo. Ele não é mariano em virtude de nossa livre opção e segundo nossas preferências. Um apostolado que não fosse mariano estaria fadado ao fracasso: “Para que o apostolado produza frutos, é moralmente preciso que seja acompanhado pela devoção a Maria. Infeliz daquele que, com o passar dos anos, perde ou deixa esfriar em si a devoção a Maria!” (Pe. Alberione).

Para que nosso apostolado seja mariano não bastam alguns gestos de piedade, antes ou depois das nossas ações ou de uma atenção passageira a Maria. A devoção mariana deve enraizar-se verdadeiramente na maternidade continuada de Maria: nossa ação apostólica deve ser concebida e vivida como uma prolongação da sua. Creio que é neste sentido que o Pe. Alberione fala de maternidade e paternidade apostólicas. Somos pais e mães à medida que “realizamos concretamente o apostolado de Maria, tornando-o atual e eficaz… o dever de dar Jesus Cristo ao mundo” (Pe. Alberione).

Segundo Pe. Alberione, “a maior riqueza que podemos dar a este pobre e orgulhoso mundo é Jesus Cristo. Maria nos deu o Cristo total, ‘Caminho, Verdade e Vida'”. Evidentemente, a missão de Maria, como mãe de Jesus, foi única. A missão do apóstolo, de ontem e de hoje, consiste em oferecer Jesus ao mundo através de seu “testemunho”. O apóstolo é a pessoa que se coloca no seguimento de Jesus e, por isso, “traz Deus em sua alma e o irradia ao redor de si”.

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