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29/03/2021

O Tríduo Pascal

Por Eligelson Barroso, Noviço Paulino

A liturgia cristã, ao longo dos séculos, recebeu inúmeros ritos, orações, cantos e toda a simbologia da tradição das primitivas comunidades. Toda essa riqueza, preservada e desenvolvida a mais de dois mil anos de história do cristianismo, remete-se a vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo, isto é, o centro de toda a celebração litúrgica.

Dentre todas as celebrações que tomam parte do ano litúrgico, como se conhece hoje, uma é considerada pela Igreja o ponto ápice de toda a liturgia cristã que é o chamado Tríduo Pascal.

A palavra tríduo deriva do latim triduum, que significa “duração de três dias”, pascal vem de páscoa, palavra hebraica que significa passagem. O Tríduo Pascal, que vai da missa vespertina da Quinta-feira Santa até o Domingo de Páscoa, inclusive, é o centro de gravidade do Ano litúrgico. Da última Ceia até o Domingo da Ressurreição transcorrem os três dias, a que Jesus fez menção várias vezes no Evangelho […] (DUARTE e LIMA, 2014, p. 20).

E acrescenta, ainda, o Missal Romano nº 18: “o sagrado Tríduo pascal da Paixão e Ressurreição do Senhor resplandece como ápice de todo ano litúrgico. Portanto, a solenidade da Páscoa goza no ano litúrgico a mesma culminância do domingo em relação à semana”. O Tríduo Pascal tem sua grande ênfase dentro da liturgia cristã sendo considerada a celebração mais importante de todo o ano litúrgico. A abordagem que este trabalho ressalta não se restringirá a elencar os elementos do rito ou da própria liturgia com toda a sua simbologia, haja vista que já o conhecemos. O escopo principal é destacar os aspectos históricos que estão por trás da riqueza dessas celebrações do Tríduo Pascal.

Desse modo, tomam-se como referência alguns escritos que remontam ao século IV onde já havia registros dessa liturgia nas Igrejas cristãs primitivas principalmente na Igreja de Jerusalém. Sobre esses registros históricos destaca-se o Intinerarium Etherial ou Itinerário de Etéria ou Egéria. O fato é que os escritos de Etéria, depois intitulados peregrinação de Etéria, fazem parte de uma espécie de diário de bordo, ou seja, essa mulher chamada Éteria teria feito uma viagem por volta do século IV que supostamente durou três anos de acordo com a descrição da própria autora. O Roteiro de viagem de Etéria compreendeu a cidade de Jerusalém e arredores com destino a Mesopotâmia. O objetivo da viagem era visitar os lugares santos e algumas das Igrejas cristãs entre elas a Igreja de Jerusalém.

[…] segundo Dom Férotin e Dom Leclerq, poderia ser inglesa, gaulesa, como o próprio abade Valério, outros que seja galesa: estes últimos invocam o testemunho da própria autora, que compara o Eufrates ao Ródano. Poderia ser, também, então, italiana, pois, segundo Pedro Diácono, compara os peixes do mar Vermelho aos do mar Itálico […] (DE ETÉRIA, 1971, p. 11).

Partindo do pressuposto do lugar de origem de Etéria interessa saber quem era essa senhora peregrina. O que se pode afirmar com veracidade é que não se sabe ao certo quem seria Etéria. Há relatos que afirmam que ela seria uma monja, mas essa afirmação não pode ser comprovada, e há outros que dizem que ela poderia ser uma virgem consagrada. Talvez a última afirmação seja mais verossímil uma vez que os registros afirmam que até o século IV não havia monjas na região de onde provinha Etéria.

Não há certeza de que Etéria fosse monja, apesar da indicação de Limoges. Valério diz virgo e sanctimonialis; objeta-se que não haveria monjas na Galiza no século IV, mas na verdade, parece que havia lá virgens consagradas a Deus, e virgo e sanctimonialis tanto podem referir-se a monjas como às virgens leigas dedicadas à vida ascética. […] (DE ETÉRIA, 1971, p. 12).

A parte considerada mais relevante dos escritos de Etéria está na descrição da vida litúrgica da comunidade de Jerusalém onde a autora relata com riqueza de detalhes o dia a dia da vida das liturgias da Igreja de Jerusalém. “Destaque especial recebem as Festas litúrgicas: a Epifania, (Natal); Apresentação de Jesus ao Templo; a Quaresma; a Semana Santa; a Vigília Pascal; a Semana da Páscoa; o Tempo Pascal, chamada Quinquagésima; a Ascenção e o Pentecostes” (DE ETÉRIA, 1971, p. 18). Ao descrever como os membros da Igreja de Jerusalém celebravam a liturgia, Etéria fizera uma descrição de como aconteciam essas celebrações e o que se celebrava em cada hora do dia.

A Semana Santa abre-se com a solene procissão dos Ramos, partindo do Monte das Oliveiras. O bispo aclamando: “Bendito seja o que vem em nome do Senhor”, e levando ramos nas mãos. Descrevem-se em seguida, as cerimônias da terça e quarta-feira. Na Quinta Santa, celebra-se a Eucaristia à tarde, e depois todos se dirigem ao Monte das Oliveiras para a Vigília (DE ETÉRIA, 1971, p. 23).

Tomam-se os relatos da Semana Santa ou Semana Maior e neles são descritos todo o itinerário das celebrações litúrgicas desses dias. Pelos próprios relatos da peregrina Etéria é possível perceber que o termo Tríduo Pascal ainda não era usado para dar ênfase aos três dias que culminam nas celebrações centrais do ano litúrgico. O termo como se conhece ainda não aparece nas descrições de Etéria, mas toda a riqueza de detalhes dos dias da Semana Santa, incluindo a quinta-feira até o domingo de páscoa são mencionados pela peregrina.

Referências bibliográficas

DUARTE, Luiz Miguel; LIMA, Antônio Lúcio da Silva. Quaresma e páscoa: como celebrar? São Paulo: Paulus, 2014.

PEREGRINAÇÃO, DE ETÉRIA. Liturgia e catequese em Jerusalém no século IV. Comentário de Frei Alberto Beckhäuser, OFM Petrópolis: Vozes, 1971.