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19/06/2020

Sagrado Coração de Jesus: seta para o Cristo total

Por Felipe Borges, Seminarista Paulino

Toda devoção católica cristã, para ser autêntica, deve estar centrada na pessoa do Cristo. A devoção ao Sagrado Coração também é assim e tem sua referência no relato neotestamentário de João, quando o discípulo amado reclina a cabeça em seu peito (Cf. 13,25) e quando o Cristo tem seu lado atravessado com uma lança e dele jorram sangue e água (Cf. 19,34). Ao longo dos séculos essa devoção foi sendo desenvolvida pelos Padres da Igreja – como Santo Agostinho (430 d.C) – e por experiências místicas de muitos Santos – como Santa Margarida Maria Alacoque (1647-1690). Tudo isso foi muito importante, embora também não tenham faltado excessos que desviaram a necessária visão cristocêntrica para uma visão vazia de conteúdo evangélico e de gestos concretos, cercada por piedosismo egocêntrico.

O aspecto do Coração

A carta encíclica Haurietis Aquas do Papa Pio XII, nos esclarece o que é efetivamente esse aspecto do coração, no parágrafo 22 (citando a Suma Teológica de são Tomás):

“Não havendo, pois, dúvida alguma de que Jesus possuía um verdadeiro corpo humano, dotado de todos os sentimentos que lhe são próprios, entre os quais campeia o amor, do mesmo modo é muito verdade que ele foi provido de um coração físico em tudo semelhante ao nosso, não sendo possível que a vida humana, privada deste excelentíssimo membro do corpo, tenha a sua natural atividade afetiva. Por conseguinte, o coração de Cristo, unido hipostaticamente à pessoa divina do Verbo, sem dúvida deve ter palpitado de amor e de qualquer outro afeto sensível; contudo, esses sentimentos eram tão conformes e estavam tão em harmonia com a vontade humana, transbordante de caridade divina, e com o próprio amor infinito que o Filho tem com o Pai e com o Espírito Santo, que jamais se interpôs a mínima oposição e discórdia entre esses três amores.”

O que esse coração tem a nos ensinar?

Ainda hoje há algumas retratações, devido aos excessos na prática dessa devoção – devido ao sentimentalismo com o qual pode cair essa devoção. Quando se faz referência ao coração de Jesus, não se quer exprimir meros sentimentos, mas o Deus amor que se faz carne e vem até nós para ensinar o caminho da vida por gestos e palavras. Por isso Pio XII exortava: “Do elemento corpóreo, que é o coração de Jesus Cristo, e do seu natural simbolismo, é legítimo e justo que, levados pelas asas da fé, nos elevemos não só à contemplação do seu amor sensível, porém a mais alto, até à consideração e adoração do seu excelentíssimo amor infuso, e, finalmente, num vôo sublime e doce ao mesmo tempo, até à meditação e adoração do amor divino do Verbo encarnado; já que à luz da fé, pela qual cremos que na pessoa de Cristo estão unidas a natureza humana e a natureza divina, podemos conceber os estreitíssimos vínculos que existem entre o amor sensível do coração físico de Jesus e o seu duplo amor espiritual, o humano e o divino.” (Haurietis Aquas, 58)

Convite a estabelecer o Reino de Deus

No parágrafo 72 da encíclica Haurietis Aquas, Pio XII exprime o desejo do estabelecimento do Reino de Deus por esta devoção: “Também vivamente desejamos que todos os que se gloriam do nome de cristãos e lutam ativamente por estabelecer o reino de Jesus Cristo no mundo, considerem a devoção ao coração de Jesus como bandeira e manancial de unidade, de salvação e de paz.”

Esse reino gera – como ele disse – unidade, salvação e paz; jamais isolamento, descompromisso com a vida do irmão e conflitos. O próprio Cristo revelou em seu coração mansidão e humildade (Cf. Mt 11,29). Agindo nós também com um coração manso e humilde colaboramos para que seu reino – que “já está próximo” (Cf Mc 1,15) – comece a acontecer.

O Cristo total

A devoção ao Sagrado Coração de Jesus em muito pode ajudar. Como bem lembra o Papa Francisco: “o coração de Jesus é o centro da misericórdia”. Num mundo líquido, marcado pela indiferença, insensibilidade e desinteresse por toda manifestação de vida – especialmente na pessoa de representantes de algumas instituições governamentais –  olhar para o Sagrado Coração de Jesus, significa deixar que nosso coração esteja revestido daqueles mesmos sentimentos do Cristo total. Com nossa mente e vontade, voltemo-nos à humanidade ferida por esta Pandemia que estamos há tanto tempo atravessando e sejamos sinais autênticos de uma caridade plena de gestos concretos, transformadores, autênticos e constante. Como dizia o Padre Virgílio Ciaccio (1927-2016), sacerdote Paulino de saudosa memória: “essa é a lição que precisamos aprender, se quisermos merecer o nome de cristãos”.

Juntos rezemos: Jesus manso e humilde de coração, fazei o nosso coração semelhante ao vosso!

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